Roberto Piva – Poema de ninar para mim e Bruegel
“Ninguém ampara o cavaleiro
do mundo delirante”
Murilo Mendes
Eu te ouço rugir para os documentos e as multidões denunciando tua agonia as enfermeiras desarticuladas A noite vibrava o rosto sobrenatural nos telhados manchados Tua boca engolia o azul Teu equilíbrio se desprendia nas vozes das alucinantes madrugadas Nas boites onde comias pickles e lias Santo Anselmo nas desertas ferrovias nas fotografias inacessíveis nos topos umedecidos dos edifícios nas bebedeiras de xerez sobre os túmulos As leguminosas lamentavam-se chocando-se contra o vento drogas davam movimentos demais aos olhos Saltimbancos de Picasso conhecendo-te numa viela maldita e os ruídos agachavam-se nos meus olhos turbulentos resta dizer uma palavra sobre os roubos enquanto os cardeais nos saturam de conselhos bem-aventurados e a Virgem lava sua bunda imaculada na pia batismal Rangem os dentes da memória segredos públicos pulverizam-se em algum ponto da América peixes entravados se sentam contra a noite O parque Shangai é conquistado pela lua adolescentes beijam-se no trem-fantasma sargentos se arredondam no palácio dos espelhos Eu percorro todas as barracas atropelando anjos da morte chupando sorvete os fios telegráficos simplificam as enchentes e as secas os telefones anunciam a dissolução de todas as coisas a paisagem racha-se de encontro com as almas o vento sul sopra contra a solidão das janelas e as gaiolas de carne crua Eu abro os braços para as cinzentas alamedas de São Paulo e como um escravo vou medindo a vacilante música das flâmulas in Antologia Poética, Roberto Piva, L&PM
Leia mais:
Publicado em 23/10/2009, em Poesia e marcado como roberto piva. Adicione o link aos favoritos. 1 comentário.
Pingback: Charles Bukowski – Roll the dice « Hilam A na Grama